Os anglo-saxões – grupo formado por povos germânicos que habitaram e governaram a Grã-Bretanha entre o século V e a Conquista Normanda, em 1066 – são sempre lembrados como as pessoas que dominaram a região durante 6 mil anos. O termo, inclusive, junta o nome de duas tribos, chamadas de anglo e saxônica.
Essas tribos são tão presentes na história que, para muita gente, anglo-saxão se tornou um sinônimo de Reino Unido. Mas agora um estudo recente revelou algo inesperado: que as pessoas com ascendência escandinava podem ter chegado na Grã-Bretanha muito antes dos anglo-saxões e dos vikings.
A chegada dos escandinavos
Uma pesquisa comandada pelo Instituto Francis Crick tem estudado as ondas de migração humana pela Europa durante o primeiro milênio d.C. utilizando um método mais preciso: a análise de ancestralidade a partir de DNA antigo.
Para fazer isso, os cientistas tentam entender como as pessoas se movimentaram durante os séculos pelo mundo observando as mudanças em seu DNA. Contudo, isso pode se tornar muito mais difícil quando grupos históricos de pessoas são geneticamente muito semelhantes.
Até então, acreditava-se que a chegada dos anglo-saxões tivesse trazido um influxo de escandinavos para a antiga Grã-Bretanha durante o século V, o que teria ocorrido após o primeiro grande ataque viking em 793 d.C.
No entanto, os pesquisadores envolvidos no estudo analisaram o DNA de um homem que se acredita ter sido um soldado romano (ou até mesmo um gladiador) que viveu entre os séculos II e IV. Eles acabaram descobrindo que 25% de sua ancestralidade era oriunda da Escandinávia.
"A ancestralidade que pensávamos que viria com os anglo-saxões talvez já estivesse lá em algumas partes", afirmou o pesquisador japonês Leo Speidel, que tem como objeto de estudo a genética populacional e assinou o artigo ao lado de colegas.
A pesquisa foi publicada na revista Nature e foi elaborada por meio de um novo método de análise de dados chamado Twigstats, que possibilita que as diferenças entre grupos geneticamente semelhantes sejam medidas com mais precisão, revelando detalhes até então eram desconhecidos sobre os fluxos migratórios na Europa.
O que foi descoberto?
Já se sabia previamente o panorama histórico das imigrações para a Grã-Bretanha. Um ponto-chave teria sido o acontecimento de 793 d.C., quando os vikings atacaram um monastério em Lindisfarne, uma ilha na costa inglesa. Isso teria dado início à chamada Era Viking, além de iniciar o influxo de DNA escandinavo para a Grã-Bretanha. Entretanto, o novo estudo desafiou essa suposição.
A partir do novo método para estudar o DNA, os cientistas acabaram determinando que o romano — que foi enterrado em York entre os séculos II e IV d.C. — tinha ascendência 25% escandinava. Ou seja, ele teria morrido centenas de anos antes de os vikings pisarem nas costas inglesas. Isso sugere que há pontos ainda obscuros na história da migração europeia e que colocam em xeque o que se sabia antes.
Ainda que os antigos romanos fossem tidos como conquistadores que atraíam pessoas de diferentes nacionalidades para as suas terras, a descoberta de DNA escandinavo em um gladiador romano foi totalmente inesperada. Em seu estudo, os pesquisadores observam que isso sugere que os escandinavos começaram a migrar para a Europa muito antes do que se pensava da chegada dos vikings.
“Isso documenta que pessoas com ascendência relacionada à Escandinávia já estavam na Grã-Bretanha antes do século V d.C., após o qual houve um influxo substancial associado às migrações anglo-saxônicas”, escreveram no artigo.
Novas descobertas sobre os fluxos migratórios na Europa
Por meio desse novo método de estudo do DNA, os pesquisadores também conseguiram identificar ondas de pessoas que migraram para o sul do norte da Alemanha e da Escandinávia no início do primeiro milênio. Isso porque seu DNA foi detectado em pessoas que viviam tanto ao sul quanto na Eslováquia e na Itália.
Eles constataram que esses grupos se situaram nesses locais e se misturaram com a população local. Só que o estudo acaba sugerindo uma inversão no fluxo, afirmando que as pessoas começaram a migrar para a Escandinávia por volta de 800 d.C. Pelo menos uma pessoa, encontrada enterrada em Öland, Suécia, tinha DNA da Europa Central. Isso pode indicar que as tendências de migração para a Escandinávia foram mudando significativamente com o tempo.
Por fim, a pesquisa apresenta um quadro mais complexo sobre como teriam ocorrido as migrações na Europa, o que sugere a necessidade de novas investigações. Ainda que provavelmente a história de vida do gladiador romano nunca será totalmente decifrada, ela abre margem para que se questione sobre outros elementos das movimentações dos povos pela Europa.
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