Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Companhia diária dos brasileiros, o Instagram é a rede social mais consumida no país. Tenho a impressão que estamos todos viciados no aplicativo e seu uso excessivo passa longe de ser apenas consumo de entretenimento vulgar inofensivo.
O aplicativo influencia nossos comportamentos, desde a busca consciente por ambientes instagramáveis para postar fotos até a influência inconsciente nas tomadas de decisões em relação à nossa saúde, portanto, merece uma análise. Olharemos sob a ótica da prática de exercícios, pois vivemos a Era do Fitness, período severamente influenciado pela rede social.
Instagram motiva para exercícios?
Quando universitárias indianas foram expostas a “posts motivacionais” no aplicativo, com fotos de Serena Williams, Michelle Obama e da atriz indiana Huma Qureshi, além de frases de incentivo, esperava-se que poderiam treinar mais nas semanas seguintes. Mas isso não aconteceu. O experimento com Instagram apenas aumentou a autoeficácia das jovens. Se exercitar é mais complexo do que apenas levantar do sofá após ter visto algo estimulante na tela.
Já um estudo com universitárias na Arábia Saudita mostrou que o Instagram foi capaz de aumentar o número de treinos delas em casa em um mês quando comparado a quem não foi incentivado pelo app. Os escassos estudos, que mostram resultados inconsistentes, não nos permitem afirmar que o Instagram de fato motiva as pessoas para exercícios.
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Experiência vicária: um impulso para acreditar que é capaz
O Instagram é uma plataforma de conteúdos que traz informações, exemplos e estratégias que podem nos ajudar. Quando percebemos alguém semelhante a nós realizando alguma atividade, isso nos fornece uma fonte de crença que também conseguimos, através da experiência vicária. Provavelmente foi isso que aconteceu no estudo com as universitárias indianas.
Em outro estudo, 68% das pessoas se sentiram encorajadas — a partir das informações postadas por influencers — para praticar atividade física. Entretanto, isso por si só não é suficiente. Mesmo formando intenções e acreditando que é capaz, quase metade das pessoas não consegue ser ativa.
Fadiga mental induzida pelos smartphones: inimiga dos bons hábitos
Com assustadoras 9 horas por dia gastas em telas, o brasileiro é o 2º no mundo nesse aspecto, sendo que dessas, 5 horas são gastas no celular. Esse tempo, cada vez maior em nossa sociedade, não é inócuo. A fadiga mental ocasionada pelo excesso de telas provavelmente dificulta nosso autocontrole — uma capacidade mental de decidir de acordo com nossos objetivos.
Antes do treino, não parece uma boa gastar tempo nas redes sociais. Foi o que uma pesquisa realizada no Brasil encontrou. A exposição de 30 minutos a redes sociais (Facebook, Instagram e Twitter) nos smartphones levou os participantes a uma maior percepção de fadiga mental e menor volume de treino durante a musculação. Uma redução de 29% nas repetições. Ainda não se sabe sobre os efeitos do uso do celular nos intervalos dos exercícios, mas parece ser uma boa evitar “scrollar” o feed das redes sociais antes do exercício.
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Apenas um lado: o do sucesso
A Era do Fitness mostra inúmeros influencers com sua rotina perfeita: acordam ao nascer do sol, retratam seu café da manhã e soltam uma superficial frase motivacional. Aparentemente, tudo é fluído e perfeito no Instagram, mascarando dificuldades que todos tem: preguiça e falta de tempo. A cultura wellness retratada no Instagram esconde dias difíceis, totalmente normais na vida de cada um, para gerar culpa e vergonha quando o comportamento não é realizado. Tais sentimentos não são boas motivações.
A comparação social ascendente é frequente nas mídias, pois parece que sempre há alguém melhor do que nós. Isso gera insatisfação. Filtros são, desde sempre, a marca registrada do app. Eles promovem padrões de beleza não realistas, sendo uma das principais fontes que influenciam a insatisfação corporal das mulheres. Lembre-se de comparar você apenas com você mesmo.
Se retratássemos francamente nossas dificuldades, fracassos e imperfeições, poderíamos elaborar estratégias para lidar com as situações, mas isso é minimizado no Instagram.
Cuidado com quem você segue
Quando pesquisadores analisaram perfis de influenciadores fitness brasileiros, encontraram resultados nada animadores. A baixa qualidade científica dos posts foi marcante, com apenas 2% deles apoiado por referências científicas. E o mais assustador: quanto pior a formação do influencer, mais seguidores. Outro estudo, nos Estados Unidos, mostrou que 97% dos posts de influenciadores fitness não possuem evidências científicas.
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Treino: com ou sem o celular?
É frequentar qualquer academia para ver as pessoas incapazes de largarem seus celulares, nos mínimos intervalos de descanso entre as séries de exercícios, quando desbloqueiam suas telas e acessam os aplicativos de redes sociais para rolar o feed, mesmo sem notificação alguma os chamando. Isso é vício — um super hábito em que nossas ações já estão inconscientes.
As recompensas fúteis do app tornam ainda mais difícil se exercitar, esse que já é um comportamento complexo. No momento do treino, caso não utilize o dispositivo para quantificar algum aspecto do exercício, deixe o aparelho guardado. Cuidado para que a necessidade de recompensas de curtidas na rede social não atrapalhe o prazer do foco no exercício físico.
O Instagram como a principal rede social no Brasil tem potencial de impactar positiva e negativamente em nossos hábitos. É ilusão acreditar que tudo depende de força de vontade individual e que o ambiente digital não nos influencia. O que está em nosso alcance é modular de maneira favorável aos comportamentos saudáveis que desejamos em nossa vida.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos.