Entre o ideal e o comercial

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Img_normalQual será a fórmula para que se possa construir do zero uma marca consagrada? É fácil imaginar que não seja nada assim tão fácil. Afinal de contas, ainda não existe um espaço no mercado para aquele jogo que se está produzindo, de forma que, seja bom o quanto for, serão questões frias como “publicidade” e “apelo amplo” que determinarão o sucesso da nova franquia... Ou acabarão por jogá-la irremediavelmente naquele famoso aterro do Novo México — E.T para Atari 2600... Alguém?

Só que parece existir também um segundo caso quando se discute mercado e games. Uma questão igualmente ferrenha, e que frequentemente coloca desenvolvedores e distribuidores de lados opostos do mesmo ringue. Tratam-se daqueles casos em que se tem uma franquia consagrada e cheia de fãs, e que quase sempre envolve outro perigo: o hype. Isso se refere àquela enorme comoção que se por um lado é alimentada por uma torrente de informações prévias dos desenvolvedores, por outro é materializada pelos fãs mais fervorosos de uma franquia.

Não é preciso viajar muito no tempo para encontrar uma manifestação óbvia do hype na indústria de games. Basta pegar o recém-lançado Gran Turismo 5, em torno do qual se criou um tremendo alarde, com promessas que só não eram maiores que a ilusão criada na cabeça de muita gente. Ao final? Apenas um jogo de corrida. Um bom jogo de corrida, cheio de detalhes e alguns poucos deslizes. Mas nada muito parecido com o castelo que havia sido construído, e que acabou afundando na areia.

Em outras palavras, criou-se a ideia do que seria a simulação de corrida definitiva, com um realismo sem igual, um vasto exemplar de carros que habitam os sonhos da maior parte das pessoas, novas mecânicas... Faltou só atentar para uma coisa: trata-se ainda de uma obra humana. Ou, para ser mais objetivo, trata-se de um produto e, enquanto tal, deve respeitar questões como “tempo”, “lucro” e “limites tecnológicos”. Seja você a Polyphony, a Nintendo, a Remedy... Enfim.

Hype vs. RealidadeQuando o resultado não é exatamente o que se esperava

GTA IV teve provavelmente uma das campanhas de marketing prévias mais espertas de que se tem conhecimento. A fórmula adotada pela Rockstar era bastante simples: praticamente nada foi dito até que o produto final tivesse sido acabado. Ok, é impossível não criar expectativa quando se tem um histórico como o de GTA, mas nada pode ser pior do que fazer propaganda de algo que você, eventualmente, não conseguirá produzir. E isso a Rockstar sabia muito bem.

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Fato é que, entre o que é idealizado na cabeça dos diretores criativos, o que é esperado por quem injeta dinheiro em uma franquia e aquilo pelo qual aguardam ansiosamente os fãs de uma série nem sempre é o mesmo produto.

Um projeto autoral de Kazunori Yamauchi

De volta ao exemplo anterior, embora a recepção de Gran Turismo 5 tenha se mostrado consideravelmente positiva, há quem julgue que, por ser Gran Turismo e, principalmente, levando-se em conta o tempo de desenvolvimento, o alarde criado e o número enorme de adiamentos, o resultado deveria apresentar mais qualidade. Afinal de contas, trata-se do que foi propagandeado como um projeto autoral do diretor da softhouse, Kazunori Yamauchi.

Img_normalProblemas com a Sony? Há quem acredite que sim. Afinal, isso se encaixaria perfeitamente com a lógica de mercado citada anteriormente. Quer dizer, uma produtora quer resultados que possam ser vendidos, e no mínimo tempo possível — o que bate de frente com a inspiração que anima as pessoas que realmente criam um jogo a partir de suas bases.

O resultado foi o que muita gente havia previsto: um jogo brilhante, porém cheio de falhas, carros com detalhamento baixo e ideias largadas pela metade — embora para isso sempre exista o estepe garantido pelas atualizações e correções online.

Há quem faça a piada em relação à suposta falta de tempo para aparar as arestas de GT 5. Em dado momento, a Sony teria encostado uma arma na cabeça de Kazunori e ameaçado: “Passe para cá tudo o que você tem”. Guardadas as devidas proporções, não é difícil acreditar em algo semelhante.

Molyneaux e o seu jogo “Super Black”

Img_normalEm uma das entrevistas prévias ao lançamento de Fable III, Peter Molyneaux resolveu ser duramente sincero: a prévia da sua dominação do reino, Fable II, foi feita às pressas, e portanto foi lançada cheia de pontas soltas. Basicamente, havia “enormes falhas de design”.

Na verdade, os deslizes foram tantos, que a Microsoft acabou colocando no título o codinome “super black”. Nada muito bom, aparentemente, já que, segundo o próprio Molyneaux, Fable II foi o primeiro jogo a ganhar tal título, que reflete os muitos bugs encontrados no produto final. “Fable II, sejamos honestos, tinha algumas coisas muito atrapalhadas”, afirmou o desinger.

O problema com Fable II foi bastante típico: muitas ideias e pouco tempo para refinar tudo. Mas, ainda em relação ao título da Lionhead, foi de qualquer forma a pressão da Microsoft que impediu algo grande, belo e cheio de erros. “[A Microsoft afirmava] que ninguém havia recebido um ‘super black’ antes”, afirmou Molyneayx. “Havia vermelho, laranja e verde. Mas não ‘super black’. Eles diziam que era praticamente impossível que alguém atingisse o super black”.

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Dessa forma, as escolhas da Lionhead eram bastante óbvias: seguir por mais tempo, construir algo exemplarmente belo e perder o patrocínio... Ou cortar boa parte da concepção original da renovada Albion, a fim de apresentar algo razoavelmente consistente. O tempo? Certamente. “Mas para ser honesto com você”, conclui Molyneaux, “ainda existem muitas falhas em Fable II”.

O hype e os periféricosDivirta-se, chacoalhe-se... Mas aguente as imprecisões

Mas não são apenas os jogos que sofrem diretamente com o alarde que é criado antes do lançamento. Basta pegar os controles sensíveis a movimentos que, após muito hype, finalmente encontraram a luz do dia fora das instalações da Nintendo. Sim, nós estamos falando do PlayStation Move e também do Kinect — antes Project Natal.

É divertido? É. Caiu como uma luva nas expectativas de uma parcela bastante considerável do público? Certamente. Entretanto, ao comparar promessas e resultados, é fácil prever que, em algum momento, o mundo encantado dos controles sensíveis encontrou as lógicas de mercado.

Senão, basta pegar as juras da Microsot envolvendo o suporte garantido do Kinect a franquias hardcore. Bastou a exibição do aparato durante a E3 para que essa ideia mostrasse suas fissuras. Uma bolinha. Ok. Jogo ao vivo diretamente no seu console! Legal. Mas e os tais jogos hardcore? Quem esperava encontrar algo realmente complexo, encontrou uma gigante do entretenimento em cima do muro e se perguntando: “O que nós devemos fazer para não perder ainda mais terreno para a Nintendo?”

Não que jogos como Dance CentralKinectimals e Sports Champions não tenham o seu brilho, e mesmo o seu (enorme) valor de mercado. O problema é que praticamente nenhuma das promessas mais viscerais tanto da Sony quanto da Microsoft foram realmente cumpridas. Mesmo para além da ideia dos jogos hardcore. Ou será que alguém realmente ficou positivamente surpreso com a apresentação de Tiger Woods PGA Tour 11 durante a última edição da E3? Enfim.

Tempo, dinheiro, público-alvo...Nem sempre é possível fazer o que se gostaria

Ao longo da história dos games, realmente não foram poucos os jogos nadaram muito para morrer na praia. Too Human? Gran Turismo 5? Final Fantasy XIII? Bons jogos, é claro. Na verdade, ao avaliar a campanha em torno de cada um desses títulos, é de se perguntar: menos propaganda teria feito melhor? Talvez.

Img_normalEntretanto, enquanto os jogos respeitarem leis de mercado, parece razoável supor que deve existir um equilíbrio muito precário entre o conceito original de um jogo, as promessas de um desenvolvedor engajado e aquilo que realmente é factível sob uma ótica mercadológica.

Afinal, se existem criadores com ideias geniais bancados a preço de ouro hoje, isso com certeza se deve ao crescente interesse comercial em torno dos outrora simplórios jogos eletrônicos. Bem, ou isso ou um futuro indie, certo?

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